A cosmologia do cão
Celso Japiassú
A tônica do livro é a de um desespero contido e que de repente, quando menos se espera, apossa-se e toma conta do leitor. Quem tiver sensibilidade e estiver fazendo uso dela para perceber o que se passa hoje com as pessoas, no mundo interior de cada uma, como reflexo do que está se passando no outro mundo, o de fora, o que cerca as pessoas, não deixará de sentir profundamente a carga de emoções trazida por cada uma das personagens deste livro.
Antônio Torres apresenta as personagens-chave por simples iniciais, revelando que voluntariamente recusa-se a nomeá-las, como a querer mostrar que por detrás deste aparente anonimato encontra-se não um homem determinado, com características bem definidas, mas o traço bem marcado de uma geração que subitamente se descobriu enganada por uma esmagadora mas bem definida escala de valores que não eram verdadeiros. A surpresa desta revelação trouxe consigo o desejo de encontrar uma saída, refletindo-se na busca caótica e desesperada que levou inclusive ao consumo de drogas e a uma perplexidade não só mal compreendida mas até mesmo reprimida com violência pelo Sistema.
O livro não critica o que apreende e que põe diante do leitor às vezes com o impacto de um soco. Nem condena ou absolve. Apenas expõe e emociona, numa linguagem clara e agressiva, mas literariamente criativa. O cão que uiva para a lua está sozinho e procura algo distante, que não sabe bem o que seja, mas que tem de ser melhor do que as amarras que o prendem.
O caminho que pode levar à libertação transforma as personagens em viajantes engajados numa peregrinação intensa e angustiante, dentro e fora de si mesmos, que só poderia se completar na compreensão da grandeza, da violência e da miséria que está presente em T. e em A., duas personagens que Antônio Torres coloca diante de nós e que assumem uma forma de espelho refletindo as nossas próprias caras.