Reedições de Antônio Torres

Gerana Damulakis
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Capas de Balada da infância perdida

O baiano Antônio Torres está tendo sua obra reeditada pela Record, a exemplo de Os Homens dos Pés Redondos, romance que saiu, em 1973, pela Francisco Alves e Balada da Infância Perdida, que havia sido publicado pela Nova Fronteira em 1986. Ainda este ano, ele lançou os contos de Meninos, Eu Conto, também pela Record. Portanto, com mais de uma dezena de livros, sua obra já figura, dada a qualidade, na história da literatura brasileira deste século que finda.

Falando sobre a história do romance escrito por baianos, o contista Hélio Pólvora, em debate na Feira do Livro, não deixou de citar Um Cão Uivando Para A Lua, quando Antônio Torres faz um romance que é um “desabafo” primoroso de uma geração. O ensaísta Jorge de Souza Araújo destaca sua preferência também por este volume, mas há os que citam primeiramente Essa Terra, de 1976. Conheci o Antônio Torres de Um Táxi Para Viena D’Áustria, em 1991, e simplesmente fiz a viagem que é o texto. Recentemente, avaliei as saborosas histórias curtas de Meninos, Eu Conto. Igualmente há que ser lembrado o cronista do suplemento Idéias do Jornal do Brasil; principalmente aquelas crônicas publicadas em 1992, dignas de lugar perene em pasta de guardados.

Estas reedições trazem uma oportunidade mais do que necessária para quem não encontra os livros esgotados de Torres. De saída, fica garantido o prazer da leitura porque no tempo da rapidez — com que pressa queremos encerrar o século! — Antônio Torres consegue exatamente isto: criar romances que têm uma velocidade formidável. Talvez seja o gosto pela frase curta, talvez seja mesmo o ritmo ágil imprimido pela própria imaginação. E voamos juntos!

No entanto, não se pense que a reflexão está ausente numa escrita que passa a impressão de ser veloz. Ao contrário, ele nos acrescenta em conhecimentos desta nossa alma humana tão complexa. O personagem de Balada da Infância Perdida é daquele tipo que o leitor logo o compreende, estabelece com ele uma ponte de entendimento quanto às suas angústias, suas voltas aos momentos do passado, que o marcaram indelevelmente. Seus mortos o habitam, o personagem vive parte no presente e parte no passado porque o momento que está sendo vivido é produto de tudo que anteriormente ele viveu. E trava diálogos com a mãe morta e nos desespera, já que não sabe o que fazer com as suas assombrações, com seus caixõezinhos, com Calunga, companheiro e praticamente irmão que, sempre querendo tomar mais uma, acabou morrendo cedo. O autor, na verdade, vai resolvendo a infância. Não dizem que ela, a infância, é a parte pior da vida,  já que passamos o resto da existência tentando resolvê-la?

Em 1986, quando da sua primeira publicação, Balada da Infância Perdida ganhou o Prêmio de Romance do Ano do Pen Clube do Brasil e foi publicado na Inglaterra e nos Estados Unidos. Não ficou nisso; outros romances foram também premiados e a maioria traduzido para várias línguas. Antônio Torres é hoje lido e reconhecido por razões que vão desde o estilo notadamente claro e límpido que assegura a leitura, até o manejo do humor para temperar a inquietação, a angústia e o desespero com que seus personagens fazem o caminho da vida. Leitura, pois, que embriaga. É o mesmo Torres quem lembra Baudelaire aconselhando que nos embriaguemos “de vinho, de poesia ou de virtude”. Aqui temos a virtude da excelente prosa de ficção.