Correio Braziliense – Segundo Caderno, 8 de agosto de 1976.
Joba Tridente
Nessa Terra
ITABUNA, 28/7/76, 10 horas da manhã, Hospedaria da Ceplac:
– Você conhece este livro, NUMA TERRA ESTRANHA?
– Deixa eu ver…; não é este aqui?
– Ah, não!
– Este eu também tenho, é o ESSA TERRA de Antônio Torres. Eu comprei e estou lendo; quero botar em pauta quando eu voltar a Brasília, agora este aqui é o livro de James Baldwin…
– Acho que vi ou li, não sei, em inglês!
– Eu gosto dos livros de Antônio Torres, se bem que este, ESSA TERRA, é o primeiro livro dele que leio. Os títulos dos outros dois livros, dele, são incríveis. Ainda não pintou de eu ler não, mas vai pintar.
– Qual são os outros livros dele?
– O primeiro foi UM CÃO UIVANDO PARA A LUA e o segundo OS HOMENS DOS PÉS REDONDOS…
– Se você tivesse chegado ontem, dava tempo de você fazer uma entrevista com ele…
– Ele estava por aqui?
– Ele veio fazer o lançamento do livro; mas acho que já foi embora.
– Espera um pouquinho…; deixa eu ligar pra um amigo…; é ele já
foi embora, está em Salvador, vai fazer o lançamento do livro lá, na
sexta-feira…; acho que vai dar tempo da gente falar com ele…
N’ESSA TERRA HÁ TERRA E N’ESSA HÁ OS HOMENS DOS PÉS REDONDOS
SALVADOR, 31/7/76, 10 horas, da manhã, Livraria Civilização Brasileira:
– Olha, eu não sei onde ele está hospedado não…; e lançamento do livro dele, foi ontem à noite, aqui…; deixa eu ver com um pessoal aqui…; olha, me parece que ele está na Pousada Colonial…
– Tem telefone lá?
– Alô… Antônio Torres?… Tem um amigo meu aqui, de Brasília, jornalista do CORREIO BRASILIENSE, que estava a fim de fazer uma entrevista…; espera um pouquinho que você fala com ele…
– Alô, Torres?… Você está bem?… A gente podia bater um papo…; a que horas?… OK, estamos indo…
SALVADOR, 31/7/76, 11:30 da manhã, Pousada Colonial
– Podemos começar?
– Olha, vai ser um bate-papo bem informal…
– O Antônio Torres, como está sendo a aceitação do ESSA TERRA pelo público – leitor?
– Muito boa. O livro está acontecendo de uma forma tão incrível que as vezes sinto até medo…
– Você sabe que sempre vi os seus livros, fiquei com uma vontade incrível de ler, mas nunca pintou…; e eu sou realmente apaixonado pelos títulos deles…
– Eles estão com edições esgotadas…; mas devem ser relançados brevemente. Eu ainda estou estudando as possibilidades do relançamento com as editoras que estão interessadas.
– Tem muita editora interessada?
– Tem!
– Agora né!!!!
– Eu acho que OS HOMENS DOS PÉS REDONDOS, você ainda encontra.
– E o leitor como está agindo e reagindo ante ao ESSA TERRA e ao Antônio Torres?
– Bom eu acho que o livro tem um grande poder de penetração, por se tratar de um assunto, que de certa forma é uma realidade de cada um. O leitor está conseguindo se encontrar no contexto do livro e eu acho isto muito favorável. O livro é de uma linguagem de fácil compreensão e interação do público-leitor…; ele se liga muito mais no livro, quando deixa o autor de lado.
– Você fez uma palestra para os alunos da Universidade Santa Cruz, de Itabuna, não fez? Como é que foi a reação do pessoal?
– Fiz sim…; aliás este é um trabalho que a gente já começou a desenvolver há algum tempo…
– … Ele deve ser a terceira pessoa?
– Terceira pessoa?
– É o seguinte, a gente estava conversando com o Telmo Padilha, e falamos da possibilidade de se trazer o pessoal do Bum-Literário para fazer palestras em Itabuna; nós sabíamos que os escritores que estavam fazendo estas palestras pelas universidades eram três: Loyola, João Antonio…; mas o terceiro a gente não sabia quem era…; esta terceira pessoa é você?
– É, sou eu. Este trabalho que a gente está desenvolvendo é muito bom. A gente quebra aquele “tabu” que existia com relação ao escritor, que sempre foi colocado num pedestal…; num ponto inatingível e se coloca frente-a-frente com o leitor, para dialogar com ele a problemática abordada no livro. É como escrever outro livro, sabe? A gente dialoga com o pessoal, fala do processo de elaboração do livro…; nós somos três escritores de estilos diferentes; abordamos literalmente problemas sociais…; mas cada um com um ângulo de visão, então o englobamento dos trabalhos faz as obras mais compreensíveis. A importância maior, mesmo, eu acho que está no fato de podermos levar o romance, a obra até o público-leitor e dialogar com ele sobre o trabalho da gente…
– Quanto tempo você levou para escrever ESSA TERRA?
– Dois anos…; Terminei em julho de 75
– E foi fácil para editar?
– O editor foi ao Rio buscar os originais, em 24 horas já havia lido e relido e me disse que faria uma tiragem de 30.000 exemplares…
– É realmente o livro está muito bem elaborado, a diagramação, a programação visual, as ilustrações do Elifas Andreato estão sensacionais…; você que chamou o Elifas para ilustrar?
– Não, foi o próprio editor. Eu só vim conhecê-lo no lançamento do livro. O Elifas disse que este era um dos melhores livros que já havia lido. Leu umas dez vezes. Viajou para varias cidades do nordeste fotografando os lugares por onde ele passava, procurando se integrar cada vez mais no contexto do livro…
– Acho que o Elifas está muito em evidência…; acho que ele devia dar um tempo…; a gente vê ele em tudo quanto é lugar…; é capa de disco, revista, jornal, livro… acho que ele vai acabar cansando e vai ser uma pena porque ele é um cara incrível…
– É, eu no principio, cheguei a ficar com medo de que não conseguisse passar a realidade do meu romance…; já o conhecia do livro do Murilo Rubião e do Roberto Drummond, e o meu é de um temática completamente diferente…; mas me enganei ele conseguiu para o leitor a essência de cada personagem, numa sequência maior que a do livro; ele deu uma nova estrutura. Eu gostei muito…
– … A Ligia Chiappini, a prefaciadora, eu também não conhecia.
– O Torres, você escreve a muito tempo?
– Há muito tempo, desde guri. Aos 17 anos comecei a trabalhar como redator em jornal, aqui mesmo na Bahia. Aos 21 comecei escrever ficção.
– Você sempre escreveu romances…; quer dizer, você também escreve contos, poemas…
– Eu escrevo mais é romance. Eu comecei escrevendo só contos, contos, contos, até que acabei escrevendo romance.
– E este seu trabalho anterior, os contos, há possibilidade de editá-los?
– Não! Eu acho impossível, estão todos sem terminar, não tem técnica nenhuma de escrita…; eu acho que não…; não vejo esta possibilidade…
– Ué, você poderia fazer uma edição de Contos Inacabados!
– HA! HA! HA! HA! HA! HA! (risos).
– Eles realmente são muito fracos, sem estrutura, cheios de defeitos…; aproveitável eu acho que somente o “Na Ilha”, se passa em Ilha Bela, mas mesmo este vejo dificuldade de recuperação. Houve uma grande evolução desde os meus primeiros escritos, até o ESSA TERRA…; e UM CÃO UIVANDO PARA A LUA, está cheio de defeitos, mas eu jamais conseguiria reescrevê-lo. Já se passou muito tempo.
– Mas a crítica sempre aceitou muito bem os teus livros!
– É, realmente eu sempre fui muito bem aceito pela crítica, mas sabe o que acontece; você escreve, escreve e vai desenvolvendo uma técnica de escrita e então você percebe os erros cometidos anteriormente…
– Você acha que antes de ESSA TERRA você era um autor conhecido pela crítica ou pelo seus livros?
– Pela crítica evidentemente. Se bem que os livros estão esgotados, mas há o problema de distribuição…; e naquela época a gente não fazia palestras, e as editoras só distribuíam os livros nos grandes centros. Hoje, está havendo uma melhor distribuição e uma melhor elaboração na apresentação do livro. A Editora Ática, está fazendo um trabalho incrível, distribuindo o livro no Brasil todo e a um preço bem acessível…
– O ESSA TERRA, tem alguma coisa a ver com os outros dois livros?
– Tem! Mas tem mais a ver com o primeiro…; é UM CÃO UIVANDO PARA A LUA às avessas.
– Com a estrondosa aceitação do ESSA TERRA, mudou muita coisa, em termos editoriais, para você?
– Ah, mudou muito. Agora, já uma série de editores a fim de publicar trabalhos meus, inclusive interessadas na reedição dos anteriores.
– Torres, você aconteceu no Bum-Literário?
– Esse negócio de Bum-Literário, é criação do Pasquim!
– Pode ser, mas eu acho que realmente houve um Bum-Literário e foi muito importante esta explosão. Ela trouxe uma “pá” de gente nova e ainda muita gente já conhecida mas inéditas…
– Eu concordo contigo, houve uma conscientização maior em termos literários. Houve uma maior mudança temática e formal. A gente, realmente, com este Bum-Literário, pode mostrar ao público-leitor um trabalho novo, criativo, que supera qualquer “enlatado”…
– … Eu cheguei a conclusão, que a gente está fazendo uma literatura, melhor que muitos gringos por ai.
– É o trabalho literário dos novos está muito bom. Se bem que novo-novo eles não são, inéditos sim. Os que estão acontecendo agora, muitos deles estavam nas gavetas ou prateleiras…
– Eu dou muita força sabe, o leitor brasileiro ainda não acredita no
escritor brasileiro, ou melhor ele não acredita no brasileiro em
qualquer que seja o trabalho que ele se propõe a fazer, em qualquer
campo artístico. Agora, quando um brasileiro acontece lá fora, ai é que
ele vira BRASILEIRO, é incrível meu irmão, mas a verdade é esta e é
por isso que eu dou a maior força a este Bum, sabe? Ele está provando
que temos condições de fazer um bom trabalho e de alto nível em
qualquer área…
SALVADOR, 31/7/76, 13:30, da tarde, Pousada Colonial:
– O Antônio Torres, você tem alguma outra profissão, além de escritor?
– Tenho, sou publicitário!
– Publicitário?
– É sou Redator de Publicidade da Standard…; a gente tem que sobreviver não é?
– Você escreve para alguma revista?
– Sou correspondente da Escrita e Versus.
– Você pode adiantar alguma cosia do seu próximo romance?
– Não! Eu apenas fiz uma pauta, antes de sair de férias, e deixei na gaveta da escrivaninha, só quando eu voltar é que vou vê-la, estudá-la e me preparar pro próximo livro.
– Você pretende fazer o lançamento do ESSA TERRA em Brasília?
– Não vai ser possível, devido ao tempo. Aqui na Bahia, eu já fiz o lançamento, aproveitando minha férias…