Armando Avena
Correio da Bahia em 29/05/2015
Era um dia de chuva, mas o auditório do Palacete Goés Calmon estava repleto para ouvir o discurso de um baiano que pela segunda vez se tornava imortal. Os baianos estavam ali, prontos a homenagear um dos maiores romancistas brasileiros que, ao lado de Jorge Amado e João Ubaldo Ribeiro, compõe a trinca de ouro da literatura baiana recente.
Olhei em volta, em busca dos meus pares, e foi então que os vi, contritos, quase circunspectos, sentados reverencialmente na primeira fila da plateia. E todos eles estavam ali: Totonhim, Nelo, Virinha, Cabralzinho, o corsário René Duguay-Trouin, Cunhambebe, com um ar heroico e libidinoso, e até Watson Rosalvelti, pronto para a qualquer momento pegar um táxi para Viena d’Áustria.
Todos estavam ali para ver ser seu criador, que os imortalizou em seus romances, também tornar-se imortal e pela segunda vez, pois a cadeira 23 da Academia Brasileira de Letras, ocupada por Jorge Amado e Machado de Assis, já lhe pertence. Então se fez silêncio e Antônio Torres leu seu discurso de posse e falou dos seus antecessores, do jornalismo e do Jornal da Bahia, da infância e dos amigos, e da sua querida Junco, cidade onde nasceu e que hoje atende pelo nome de Sátiro Dias.
Depois, um lágrima, real ou imaginária, desenhou-se em cada rosto quando ele lembrou de João Ubaldo, que o chamava de compadre, e da dor de sua morte. E a saudade o fez declamar os versos de T.S. Eliot: “Morremos com os mortos/ eles partem e com eles nos levam./Nascemos com os mortos./Eles retornam e consigo nos trazem”. No auditório do Palacete Góes Calmon, Antônio Torres trouxe Ubaldo de volta e nos fez retornar.
O escritor Antônio Torres de há muito alcançou a imortalidade e o fez por sua obra, pelos prêmios que recebeu, por ter sido condecorado pelo governo francês, como um preito aos romances que publicou na França, e por envergar o fardão da Academia Brasileira de Letras. Agora, a Bahia o tornou imortal pela segunda vez, uma imortalidade carinhosa de mãe orgulhosa do seu filho.